Hoje vou falar de uma vivência que tive com uma pessoa muito especial para mim, vou me referir a ela como Dona E.
Eu escrevi este conto para a contribuição da pioneira experiência do Contos da Nossa Gente. Além de mim, outros estagiários de Psicologia contribuiram para este maravilhoso acontecimento (onde eu trabalhava, na São Paulo Transportes S/A (SpTrans). A experiência é uma seleção de relatos de vivências no processo de atendimento. Porém o meu é um pouco diferente, não foi bem em um atendimento e sim em uma conversa.
VEJA...
Estagiando no Posto de Vila Prudente.
Tantos aprendizados que, com certeza, levarei para o resto da minha vida.
Tenho tantas coisas para compartilhar, mas vou dizer algo que fez e faz toda diferença em minha trajetória.
Uma funcionária da Subprefeitura possui deficiência visual. É uma pessoa que, apesar da limitação, supera muitos desafios por meio de suas outras habilidades e características pessoais, pois é esforçada, inteligente, comunicativa, responsável e notável “cantora” (já foi professora de música).
Soubemos que não se retrai diante da deficiência, é muito disposta, faz passeios a diversos lugares, sendo que muitos exigem considerável esforço físico. Além disso, ainda cuida de seu esposo, que se encontra debilitado devido a problemas de saúde.
Em uma de nossas conversas, em um momento tranquilo de seu dia, ela disse algo que me fez refletir muito sobre a imagem que construímos e a forma de nos relacionarmos com as pessoas com deficiência. Sua fala para mim foi: “As pessoas nos vêem ou como guerreiro ou como uma coitadinha”. Olha lá! Que dó dela, como é guerreira! Continua lutando, mesmo sendo cega!
Mostrou-me o quanto revelamos nosso preconceito ao menosprezarmos a capacidade de alguém, por acharmos que seria valentia mostrar habilidades qualquer, simplesmente por possuir uma limitação visual.
Ao ouvi-la dizer: “Eu sou uma pessoa!” entendi a dimensão de suas palavras. Ela é mais do que uma deficiência, é uma pessoa única, com facilidades e dificuldades, com dúvidas e certezas, com limitações e capacidades, e com sua personalidade como qualquer outra pessoa... como eu... como você... Que sente, que ri, que se irrita, que chora, como qualquer outro, com ou sem deficiência.
E eu me reconheci naquele lugar, refleti e explorei com o passar dos dias, de uma forma completamente diferente de olhar para as pessoas. Passei a vê-la e a tratá-la como uma pessoa, e a admirá-la e respeitá-la ainda mais por me ensinar a sair de meus “achismos e rotulações”.
E perceber que tem, sim, um outro ser, ali do meu lado, que simplesmente existe, e que tem vivências, linguagem e saberes, assim como eu.
Quantas e quantas vezes e quantas pessoas não se colocam neste papel?! Fazendo acepção de pessoas? Por visualizarmos às vezes como coitadinho ou como guerreiro... principalmente quando esta pessoa tem uma deficiência.
Vivendo com Dona E. por quase dois anos, posso dizer com toda certeza que ela é especial para mim por contribuir na minha construção como pessoa e por me ajudar, mesmo sem saber, a tratar o outro realmente como igual a mim, independente de sua limitação, seja ela qual for. Esta experiência nenhum dinheiro do mundo paga!
Se permita conhecer as pessoas como realmente elas são, tenho certeza que a "Primeira Impressão" não é a que irá ficar!
Por Érica Alves Marchetto
Este conto foi escrito em Novembro de 2011, por Érica Alves Marchetto – Subprefeitura de Vila Prudente/ Sapopemba.
Revisão texto: Sergio Rocker